Alguns transtornos passam despercebidos, pois são demonstrados por comportamentos comuns na vida da pessoa. Quando o hábito de arrancar os cabelos se torna patológico? Entenda abaixo.
O que é tricotilomania?
Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, a característica essencial da tricotilomania consiste em puxar ou arrancar os próprios cabelos de maneira recorrente, resultando em perda capilar perceptível em qualquer região do corpo, sendo classificada como um dos transtornos do controle de impulsos. Foi assim classificada pois é marcada pelo impulso do qual a pessoa não consegue se controlar. A tricotilomania é mais comum no couro cabeludo, sobrancelhas, barba, cílios e pêlos púbicos, provocando prejuízos na área afetiva e social do indivíduo de forma biopsicossocial.
O hábito tem início pouco antes ou depois da puberdade e cerca de 1 a 2% das pessoas têm o transtorno, sendo 90% dos adultos do gênero feminino. É geralmente um transtorno crônico, contendo oscilações dos sintomas, podendo variar entre um paciente ou outro.
Histórico da tricotilomania
O termo tricotilomania deriva do grego “loucura de arrancar os cabelos” e foi utilizado por Hallopeau no início do século 20 para descrever o comportamento de pessoas que arrancavam os próprios cabelos.
Sintomas da tricotilomania
Os sintomas clínicos da tricotilomania incluem um sentimento crescente de tensão, antes de arrancar os cabelos, e prazer, gratificação ou alívio quando puxa os cabelos.
Alguns transtornos estão associados como o transtorno obsessivo-compulsivo, transtorno de personalidade borderline e transtornos depressivos. A diferença entre indivíduos com tricotilomania e pessoas com TOC é que as primeiras não possuem pensamentos obsessivos, a atividade obsessiva está limitada a um só ato: o de arrancar os cabelos. Geralmente arrancam os cabelos sem perceberem totalmente, em vez de reduzir impulsos, ansiedade ou responder a uma obsessão.
Os critérios diagnósticos da tricotilomania são:
- Remoção de cabelo;
- Fazer tentativas repetidas de parar de arrancar cabelo;
- Experimentar sofrimento significativo ou comprometimento das atividades, incluindo sentimentos de constrangimento, vergonha, perda do autocontrole e consequências estéticas.
Rituais antes de arrancar os cabelos
Uma série de comportamentos ou rituais podem acompanhar o ato de arrancar o cabelo. Os pacientes podem procurar meticulosamente um determinado tipo de cabelo para arrancar, tentam assegurar que os fios sejam arrancados de forma específica. Podem enrolar o cabelo, puxar os fios entre os dentes ou morder o cabelo depois de arrancado. Muitos pacientes engolem os fios de cabelo, ocorrendo o acúmulo de fios de cabelo engolidos que ficam presos no estômago, e raramente levando a complicações clínicas ou cirúrgicas que possam exigir intervenção.
Frequência do comportamento
A agressão aos cabelos geralmente ocorre quando o indivíduo está assistindo televisão, estudando ou falando ao telefone, e pode ser intensificada por uma situação estressante, como a preparação para uma prova, por exemplo. A extração do pêlo nem sempre é imediata, sendo que alguns indivíduos permanecem por horas torcendo os cabelos com os dedos, manipulando-os até extraí-los. A tricotilomania pode alternar entre períodos de exacerbação e de acalmia.
Subdiagnóstico da tricotilomania
A tricotilomania pode ser subdiagnosticada pois dificilmente o indivíduo consulta uma média por apresentar o transtorno. A ajuda só é buscada quando o quadro se agrava de modo que afeta a vida social e emocional do indivíduo. Na maioria dos casos, o paciente vem acompanhado de alguém próximo na consulta, o qual geralmente é quem tem maior interesse pelo tratamento. É comum que esses pacientes já tenham passado por diversos médicos, tendo dificuldade para admitir a hipótese do diagnóstico de tricotilomania, e muitos indivíduos não retornam após a confirmação do diagnóstico.
Tricobezoar
O tricobezoar é uma massa formada a partir dos pêlos e cabelos deglutidos impactados no interior do trato gastrointestinal e pode assumir formas mais graves, nas quais o bolo de cabelo ingerido ocupa uma parte importante do intestino, causando dores abdominais, náuseas, vômitos, anemia, hematêmese, úlceras, pancreatite e até mesmo perfuração intestinal e abdome agudo obstrutivo. Em alguns casos esses tricobezoares se estendem até o cólon, por meio de uma extensa cauda de fios, recebendo a denominação de Síndrome de Rapunzel, em alusão à princesa do conto de fadas.
Consequências biopsicossociais
A tricotilomania afeta a saúde mental do indivíduo, que podem se sentir constrangidos e envergonhados com sua aparência ou com a incapacidade de controlar o comportamento. Muitos tentam camuflar a perda de cabelo cobrindo as áreas calvas, outros arrancam fios de cabelo de áreas amplamente espalhadas para disfarçar a perda. Podem evitar situações em que outras pessoas possam ver a perda de cabelo e não arrancam o cabelo na frente de outras pessoas, exceto membros da família.
Tratamento da tricotilomania
O tratamento visa diminuir os comportamentos frequentes e repetitivos inconvenientes tanto para si próprios, como para outras pessoas. Assim, o método de reversão de hábito tem sido usado com eficácia. O método possui três componentes: primeiro o paciente aprende a descrever e identificar o comportamento problema, em segundo o paciente aprende e treina a emissão de um comportamento incompatível ou que concorra com o comportamento-problema diariamente, e por fim, procura se motivar, revendo as inconveniências causadas pelo transtorno, registra e faz gráficos do comportamento e pede que um membro da família reforce a adesão ao comportamento saudável. Pode-se, ainda, utilizar o treinamento da conscientização (automonitoramento, identificação de gatilhos para o comportamento), controle de estímulos, treinamento de resposta alternativa ou competitiva, entre outras técnicas psicológicas.
Para o arrancamento de fios de cabelo a clomipramina tem sido eficaz para tratar as consequências do transtorno, embora estudos ainda continuem ocorrendo nessa área. Assim, existem terapias para a tricotilomania e caso os sintomas causem prejuízo, indica-se procurar um profissional da saúde.
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Referências:
GOULART-JUNIOR, R.M. & BRITTO, I.A.G.S. Intervenção analítico=comportamental em tricotilomania. Rev. bras. ter. comport. cogn. 2010;12(1-2).
Manual DSM. Tricotilomania. Disponível em: https://www.msdmanuals.com/pt/profissional/transtornos-psiqui%C3%A1tricos/transtorno-obsessivo-compulsivo-e-transtornos-relacionados/tricotilomania
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